“É EVIDENTE QUE ESTÁ HAVENDO UMA TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS PÚBLICOS PARA O SETOR FINANCEIRO PRIVADO”, AFIRMA MARIA LUCIA FATTORELLI SOBRE A DÍVIDA PÚBLICA

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Coordenadora da Auditoria Cidadã diz que só a mobilização social levará a Nação a se livrar das amarras do capital

Maria Lucia Fattorelli, auditora aposentada da Receita Federal e coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, palestrou sobre o sistema da dívida pública no País durante o II Congresso da CSB. A auditora alertou para os números, que denunciam que a dívida é um mecanismo abusivo, responsável por barrar o desenvolvimento nacional. Em 2015, a dívida pública brasileira cresceu R$ 732 bilhões. De janeiro a dezembro do mesmo ano, a dívida consumiu R$ 962 bilhões, o que representa 42% do gasto federal. A dívida interna ultrapassa R$ 3,93 trilhões e a externa chega a US$ 545,3 bilhões.

“A dívida poderia ser positiva. Poderia ser um instrumento de financiamento para complementar os recursos necessários aos investimentos e garantir os direitos sociais, mas quando investigamos encontramos um mecanismo. Esse mecanismo de transferência de renda é o que amarra o gigante Brasil”, afirmou.

Maria Lucia aponta que há uma inversão das prioridades do Estado, que – por meio de privatizações e concessões – tem cedido aos caprichos do capital. “É evidente que está havendo uma transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado. E a mola mestra para essa transferência chama-se Sistema da Dívida”, revelou.

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“Essa dívida sem contrapartida, sem a aplicação dos recursos nas áreas sociais e nos serviços públicos, gera juros sobre juros, conflito de interesses e falta de transparência”, destacou a coordenadora da Auditoria Cidadã.

Em sua análise, a especialista afirma que os brasileiros estão vivendo uma injustiça inaceitável, com a entrega da estrutura de Estado, sob a justificativa de o País ter uma dívida a ser paga. “A dívida esta sendo usada como um saque de recursos. Eu pergunto: Na nossa vida pessoal, só existe dívida quando há entrega. Se a dívida pública fosse real, o Brasil teria recebido 732 bilhões, certo? Se a gente tivesse recebido isso em um ano, estaria faltando recursos para investimentos?”, questionou Fattorelli.

Em 2014, o governo federal gastou 45,11% de seu orçamento com o pagamento de juros da dívida, enquanto a Previdência Social recebeu apenas 21,76% dos recursos e a saúde, 3,98%.

Além desta disparidade, um outro exemplo das estruturas de Estado comprometidas por causa da dívida é, segundo a coordenadora da Auditoria Cidadã, a tentativa de privatização da Petrobrás. “Existe um projeto que tira a obrigatoriedade da Petrobrás de participar dos leilões do Pré-sal, permitindo que somente as empresas estrangeiras participem. Outro projeto: entregar o Banco Central aos banqueiros. Desde a época do Juscelino Kubitschek o Banco Central é voltado para o capital financeiro por causa da influência do FMI”, criticou a palestrante.

Lucro dos bancos e o sistema financeiro

Em 2015, os maiores bancos privados nacionais lucraram juntos R$ 80 bilhões. Na análise de Fattorelli, o serviço da dívida é o grande motor dessas exorbitantes cifras. “Nossa crise é uma crise econômica seletiva, porque os bancos não estão em crise. Eles nunca lucraram tanto”, disse Maria Lucia. “A taxa básica de juros (Selic) chegou em 14,25%, mas o Banco Central leiloou os títulos da dívida a 16,81%. Onde está esse dinheiro?”, indagou.

A especialista reitera também que quando se fala de ajuste fiscal, o governo aplica o corte de direitos, de investimentos e o aumento dos tributos, já que a taxação de grandes fortunas não é discutida. “A cobrança de tributos de grandes fortunas não está na pauta, pois isso não é interessante para o governo”, afirma.

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Luta pela auditoria

A auditoria feita no Equador, da qual Maria Lucia Fattorelli participou, aponta que o País anulou 70% da sua dívida com os bancos privados internacionais. “Cerca de 95% dos detentores da dívida equatoriana aceitaram a proposta feita pelo país, que vai economizar US$ 7,7 bilhões nos próximos 20 anos e hoje investe em saúde e educação”, revelou Fattorelli. “O Brasil poderia usar o Equador como exemplo, mas isso não acontece”, completou.

No Brasil, a presidente Dilma Rousseff vetou, em janeiro, a auditoria da dívida pública incluída na lei do Plano Plurianual (PPA) 2016-2019 e aprovada pelo Congresso Nacional. Fattorelli explicou que a Auditoria Cidadã pretende lutar pela derrubada do veto presidencial. “Depois de 15 anos de existência, nós conseguimos incluir a indicação para a realização da auditoria da dívida no Plano Plurianual. Foi uma grande vitória, o Congresso votou e aprovou. O que aconteceu? A Dilma vetou, impedindo a auditoria indicada no PPA. Nós entendemos que este veto é um equívoco e estamos lutando para derrubá-lo”, disse.

Para a palestrante, a saída passa pela mobilização da sociedade. “É o nosso país, um país riquíssimo, abundante. Precisamos partir para ações concretas. Nossa arma é o conhecimento, a mobilização social consciente. Vamos trabalhar para isso e incentivarmos a criação de núcleos da auditoria cidadã para que a população tenha consciência de todo este cenário desastroso”, enfatizou Maria Lucia Fattorelli.

Em apoio à iniciativa da Auditoria Cidadã, a diretoria da CSB aprovou uma moção, que será enviada ao Congresso Nacional, em nome da Central, pedindo aos parlamentares a derrubada do veto. Neto também propôs uma campanha individual. “Que cada companheiro e companheira, cada entidade, possa divulgar em seu site, com boletins, mobilizando suas categorias para também incorporar a luta pela derrubada do veto”, declarou o dirigente. Além disso, o presidente reiterou o apoio financeiro da Central ao trabalho da Auditoria Cidadã da Dívida Pública.

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