“É UMA DESTRUIÇÃO DA PREVIDÊNCIA, NÃO UMA REFORMA”, AFIRMA PRESIDENTE DA CSB

“É uma destruição da Previdência, não uma reforma”, afirma presidente da CSB

Modelo de capitalização proposto na Previdência responde aos interesses do mercado financeiro, segundo o sindicalista

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 6/2019, do governo Bolsonaro (PSL), não deveria sequer ser chamada de “reforma”. Essa é a opinião de Antônio Netto, presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), em entrevista ao Brasil de Fato.

Segundo o sindicalista, as mudanças propostas pela equipe econômica desmontam as bases da Previdência Social e amplificam o poder dos bancos.

Confira a entrevista completa:

Brasil de Fato: O que significa, na prática, essa reforma da Previdência proposta pelo governo Bolsonaro?

Antônio Netto: Essa é a primeira vez que há uma ousadia tão grande das elites, em especial do rentismo, de fazer um ataque à Previdência Social no Brasil. Há uma grande narrativa de que a Previdência é falida, de que daqui a pouco não vai ter dinheiro para pagar os trabalhadores e uma mentira sendo repetida muitas vezes as pessoas até acreditam.

Como era um modelo de repartição, antigamente 6 trabalhadores da antiga bancavam um trabalhador aposentado. Hoje em dia 1,6 trabalhadores da ativa bancam um aposentado e no futuro a tendência é cada vez menos trabalhadores na ativa e mais pra bancar e aí ficaria impossível. E esquecem do principal: de que a nossa Previdência não pode ser olhada dessa forma. Essa Previdência tem que ser olhada no contexto de uma Seguridade Social em que toda a sociedade brasileira tem que contribuir para a saúde, Previdência e Assistência Social. Então nesse ataque que vem, é um ataque para destruir aquela visão social que a Previdência teve com o movimento feito durante a Constituição. Então essa visão diferenciada do rentismo é pra acabar de vez com a Previdência Solidária, que é a seguridade social, e transformar num sistema de capitalização, onde cada um vai guardar o seu dinheiro em uma poupança nos bancos privados para que você possa daqui a 30 anos ter uma aposentadoria da Previdência privada.

Nós estamos discutindo efetivamente o modelo que nós queremos para o Brasil, ou seja, queremos o modelo social, progressista, de cobertura global ou queremos um modelo de exclusão e acabar com toda Previdência Social.

O governo fala em acabar com privilégios na reforma, mas, no fundo, parece que só prejudica os mais pobres. É essa a sua interpretação?

É prática deles, então veja: é tão sem sentido essa reforma que ela copia a reforma do [ditador chileno Augusto] Pinochet de 1981, com os mesmos princípios, as mesmas bases. Enquanto o mundo está querendo copiar o modelo de Seguridade Social do Brasil hoje, eles trazem o modelo de lá que. Acontece que, 30 anos depois, o modelo chileno começa a mostrar que não funciona. Ou seja, as aposentadorias no Chile caíram barbaridades, o recebido pelos aposentados caiu de uma maneira absurda, está havendo suicídio de idosos lá porque não tem condição de se manter, entre outras desgraças

O governo chileno inclusive passou a dizer agora que também tem que incluir uma nova contribuição patronal para ajudar a sustentar o Sistema Previdenciário, que o modelo de capitalização por si só não se sustenta. Veja, a ONU fez um estudo através da OIT (Organização Internacional do Trabalho) que mostra que 30 países adotaram a privatização da Previdência, o sistema de capitalização. E 18 estão voltando atrás porque não deu certo.

A reforma de Bolsonaro não ataca privilégios, é só olhar o que eles lançaram agora com as modificações na Previdência dos militares você vê que ali não tem nada. Além disso, os grandes salários não são colocados nesse pacote, o Judiciário não está aí, o Legislativo não está aí, ou seja, vai mexer com o pobre. A gente até brinca dizendo o seguinte: querem economizar em 10 anos um trilhão de reais, mas é no sacrifício da classe operária, do homem do campo, do povo mais pobre, do velhinho desamparado. E esquece, por exemplo, que em uma canetada, o governo anterior fez uma Medida Provisória que deu às empresas transnacionais do petróleo isenção fiscal tributária, dando R$ 1 trilhão de reais em 20 anos. Ou seja, o que eles querem amassar na Previdência, dão de mão beijada para as grandes empresas do petróleo mundial.

A Previdência é vista como despesa para o governo, mas por outro lado, a economia de muitas cidades depende desses brasileiros que recebem da Previdência seu benefício. Não é desconexo você tirar um dinheiro que ajuda a movimentar a economia de cidades pequenas?

Isso é um descalabro. Já foi feito uma estatística mostrando que quase 80% dos municípios do Brasil recebem mais através do INSS, pelas aposentadorias dos trabalhadores e pensionistas, do que o Fundo de Participação do Município. E aquilo faz girar a economia local, que por sua vez volta em impostos para o estado. Mas, esse modelo assumido agora por esse novo governo é um modelo totalmente capitalista selvagem que quer destruir todo o aparato protecionista do estado.

O que eles querem é colocar na Previdência a tal da Previdência Complementar privada, o tal do fundo de capitalização. É colocar uma Previdência Pública bem minoritária, bem básica, um ou dois salários e aí todo mundo vai contribuir nessa Previdência complementar na mão dos bancos. E aí, imagine você, começamos agora, que para se aposentar nessa Previdência são 30, 25 anos, imagine o bolo de dinheiro que vamos entregar para os bancos para durante 30 anos fazer o que quiserem com o dinheiro do povo brasileiro. Quem sabe se daqui 30 anos vai haver um desses bancos? Ou de repente, num “azar” da bolsa de valores, pulveriza todo o investimento dos trabalhadores? Por isso somos contra essa privatização da Previdência.

Como vocês estão vendo a pressão tão forte do empresariado e a disputa do Congresso em relação a reforma da Previdência?

Primeiro é bom clarear, não são os empresários, são os bancos. O rentismo, que já toma 40 ou 50% do orçamento de todo orçamento da nação, por uma questão de juros, pagamento principal da dívida, mais a rolagem da dívida, precisa comer mais dinheiro do orçamento público, o orçamento da saúde, da segurança pública, das infraestruturas, ou seja, eles querem isso. E essa é uma grande fatia, é mundial, se você olhar no mundo todas as pesquisas mostram. E realmente os fundos privados é que querem tomar esse dinheiro. E nós, debatendo no Congresso Nacional, alertando o povo brasileiro, por isso é importante uma entrevista como essa, porque os trabalhadores tenham claro que isso não vem pra ajudar, não vem para acabar com privilégio, vem pra satisfazer a sanha do rentismo, daqueles que precisam explorar o capital. Agora a questão é como é que nós vamos nos organizar para derrotar isso mais uma vez.

Nós derrotamos todas [reformas da Previdência] até agora, então vamos derrotar essa, mas pra derrotar essa precisamos estar unidos, organizados, participando das mobilizações, pressionando os deputados, os senadores, pressionando nos aeroportos, mandando e-mail pras suas caixas postais, pressionando na residência,  ou seja, para que ele saiba que ele não pode cometer esse crime. Aliás, a gente tinha até aquela frase que usamos na reforma trabalhista “quem vota não volta”. A maioria não voltou, o [o deputado Rogério] Marinho (PSDB) que hoje é o tal do secretário da Previdência foi o relator da reforma trabalhista e não foi reeleito no RN.

E é bom eles terem claro isso, quem votar nisso não volta, porque isso é um crime lesa pátria, lesa trabalhador.

Fonte: Libera Pensado

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